quinta-feira, 31 de outubro de 2024

Miúdos a votos - II

 


“Miúdos a votos” é uma iniciativa que procura promover a ideia de uma participação cívica pela apresentação e defesa das ideias que um determinado livro nos pode suscitar.

      Na primeira fase os alunos que queiram participar devem indicar (até 10 de novembro) neste  formulário o título de um livro, o autor desse livro, o nome completo da escola e o ano de escolaridade. Deve ser indicado o título do livro e não o nome de uma coleção.

    A partir das escolhas dos alunos haverá a constituição de uma lista a nível nacional que será revelada no dia 6 de dezembro.

    Após este conhecimento propõe-se que os alunos realizem uma campanha eleitoral sobre um determinado livro e que durará de 20 de Janeiro a dez de março de 2025.  A votação final a realizar na escola realizar-se-á a 12 de março e o resultado final deve ser divulgado com a realização de uma atividade entre 12 de março e 30 de abril. Os resultados finais a nível nacional serão divulgados a 16 de maio de 2025.

    Um dos aspetos mais interessantes desta atividade é a realização de uma campanha eleitoral de argumentação sobre o valor de um livro. Podem ser usadas diferentes formas como:

   - criação de materiais, como cartazes ou folhetos;

   - vídeos ou podcasts com a imagem do livro e um áudio com a apresentação das principais ideias;

   - divulgação nos meios digitais (blogue da biblioteca).

  Haverá um prémio para as melhores campanhas devendo os materiais dever ser enviados para a biblioteca entre 20 de janeiro e vinte de março. Deixa-se em anexo o regulamento para essa candidatura.

   Neste momento e até ao final da próxima semana os alunos interessados devem indicar o título de um livro, o autor desse livro, o nome completo da escola e o ano de escolaridade neste link que se disponibiliza.

 Alguma dúvida para o preenchimento online pode ser feita na biblioteca.

Leituras na Biblioteca - Matilde, um olhar de menina...

Era uma vez uma menina que gostava muito da natureza, em especial das árvores, dos animais e sentia-se muito feliz. 

Todos os dias ela ia brincar ao ar livre. 

As suas estações do ano preferidas eram o verão e a primavera, pois podia ir mais vezes para a natureza.

No verão ela gostava muito de ir nadar no mar da praia. E na Primavera gostava de ouvir os pássaros a cantar as suas melodias.

Ela era uma menina saudável porque comia muitos frutos. A sua árvore preferida era a laranja.

Ela sentia-se muito feliz na natureza.

Algumas das ideias visuais construídas pelos alunos (ABL3), a partir de uma biografia sobre Matilde Rosa Araújo. Na atividade as crianças conseguiram de diferente modo associar os planos da narrativa, a quinta, a natureza, os animais, a praia às suas construções visuais. Na escolha das palavras-chave identificaram aquilo que marcou a vida e a biografia de Matilde Rosa Araújo. atividade realizada a partir da leitura orientada do livro de Adélia de Carvalho, Matilde, um olhar de menina.


 




segunda-feira, 28 de outubro de 2024

Mês Internacional das bibliotecas Escolares

"A Biblioteca terá que ser o centro da sociedade. O homem é um animal leitor, leitor do mundo. Procuramos as constelações da narração: quem são os outros e onde estamos. Desenvolvemos o poder da imaginação. Somos capazes de criar o mundo, antes mesmo da criação do mundo.

As bibliotecas são a memória privada e a memória pública. A biblioteca é autobiografia de cada um. É o rosto de cada um de nós. As bibliotecas são também a biografia da sociedade, a sua identidade. As bibliotecas públicas são o rosto da comunidade.

Nós somos o que a biblioteca nos recorda o que somos. Um livro conta a experiência de cada um, onde estão as paixões mais secretas e os desejos mais íntimos. "Clínica da alma" é a sua melhor definição. A centralidade da atividade inteletual está na clínica da alma!"...

 Alberto Manguel, "Reading and Libraries", 11º Congresso da BAD

sexta-feira, 25 de outubro de 2024

Livros do mês - Outubro III


 "Era linda a água vista do sol!
Depois, pela vida fora, a água da fonte eram vocês...
Água pela qual seria capaz de partir todos os copos de cristal." (Matilde Rosa Araújo)

Era uma vez uma menina com cabelos loiros caídos até aos ombros. Dos seus olhos claros - diz quem alguma vez os fixou - transbordava um mar de interminável ternura. Olhava para tudo como se fosse sempre a primeira vez. E a sua voz era uma das mais meigas e suaves que alguma vez se escutou. Eu, que a ouvi muitas vezes, digo-vos que Matilde nunca deixava de falar com a alma e o coração.

Vivia numa quinta grande dos avós. Nessa quinta existia um grande jardim de rosas vermelhas e violetas rasteiras. A porta da entrada era decorada por uma frondosa trepadeira de flores que ora pareciam azuis ora roxas. Matilde chamava-lhe Buga. Nas noites quentes, quando o cheiro da trepadeira inundava o jardim, Matilde e a amiga tinham longas conversas. Era um segredo só das duas. Matilde, gostava tanto dela, que quando o seu gato dourado morreu, quis que ele ficasse sepultado junto às suas raízes. (...)

O Jardim tinha ainda espaço para algumas árvores de frutos: laranjeiras, macieiras, cerejeiras e oliveiras com folhas cor de prata. Matilde gostava especialmente de uma das laranjeiras. Devido ao amor que lhe tinha, ficou com a alcunha de Laranjinha. Essa árvore tinha um tronco forte onde, bem no meio, havia uma covinha que parecia um banco. Matilde sentava-se aí a ler poemas em voz alat para a laranjeira, para os pássaros e para as formigas que ali passavam em carreirinho. Ela gostava de ouvir o som das palavras, para as saborear com todos os sentidos. Procurava a música própria de cada uma e a seguir desenhava-as cuidadosamente, letra por letra. No fim, surgiam palavras de todos os tamanhos, cores e feitios. Um jardim encantado de palavras.

Carvalho, Adélia. (2010). Matilde, um olhar de menina. Lisboa: Tcharan.

As mais belas coisas do mundo I

   "(...)Nesse tempo, meu avô perguntou quais seriam as mais belas coisas do mundo. Eu não soube o que dizer:
  Pensei que poderiam ser os filhotes de cão, alguns gatos, o fim do sol, o verão inteiro, o comportamento dos cristais, a muita chuva, a cara das mulheres, o circo, os lobos, as casas com chaminé, o cimo da montanha, a nuvem que vimos igualzinha a um avião, o quadro pintado pendurado na sala, perfeitinho, mesmo que as árvores inclinassem um bocado tortas.
    Pensei que as mais belas coisas do mundo haveriam de ser as amarelas e as vermelhas.
    Ele sorriu e quis saber se não haviam de ser a amizade, o amor, a honestidade e a generosidade. o ser-se fiel, educado, o ter-se respeito por cada pessoa. Ponderou se o mais belo do mundo não seria fazer-se o que se sabe e pode para que a vida de todos seja melhor.
    Convenci-me de que as mais belas coisas do mundo se punham enquanto profundo e urgentes mistérios. (...)
   A beleza, compreendi, é substancialmente um atributo do pensamento, aquilo que inteligentemente aprendemos a pensar. A força do pensamento haverá de criar coisas incríveis, científicas, intuitivas, maravilhosas, profundas, necessárias, movedoras, salvadoras, deslumbrantes ou amigas. Pensar é como fazer. Quem só faz e não pensa só faz uma parte. Para a beleza é preciso acreditar."

A Filosofia para crianças não procura respostas, mas sim a possibilidade de realizar perguntas, pensar para compreender de um outro modo. A partir da leitura de alguns excertos do livro de Valter Hugo Mãe, um grupo de crianças do 4.ºa no - ABL pensou em grupo no que poderiam ser essas mais belas coisas do mundo.

 Surgiram várias perguntas:

1. Por que existe a imaginação?

2. Quais são as mais belas coisas do mundo?

3. Como as pedras podem ter sede se não estão vivas?

Das diversas questões colocadas as crianças escolheram três e com essas foram colocadas mais dúvidas e questões para se encontrar alguns pontos de concordância sobre o valor das mais belas coisas do mundo.

 A palavra não é a única linguagem possível de utilizar. Podemos pensar também com as imagens ou traduzir nelas ideias. Podem as ideias ser desenhadas? Desenhar os elementos da história lida e pensada e encontrar na imagem desenhada uma ideia capaz de nos fazer pensar sobre as mais belas coisas do mundo. Alguns exemplos: (ABL -4).


 

 


quarta-feira, 23 de outubro de 2024

Semana da alimentação III


A Biblioteca em articulação com o PES e com a Ciência Viva tem vindo a realizar algumas sessões sobre a alimentação mediterrânica e o desperdício alimentar. Os alunos tomaram contacto com algumas das ideias que organizam a dieta mediterrânica tendo sido disponibilizado um folheto sobre três dos alimentos que integram esta alimentação.

Foi dada uma contextualização histórica ao que é a alimentação mediterrânica, nomeadamente o seu património cultural como valor imaterial da humanidade e a sua ligação *as civilizações do Mediterrâneo. Foram assim destacados o sal, o vinho, o azeite e os cereais. Foram abordados os aspetos nutricionais e a sua influência na saúde humana.

Numa segunda vertente os alunos foram confrontados com a temática do desperdício e da fome e o que pode ser feito para ajudar localmente a dar uma resposta individual a esta questão. Com base num diálogo conversámos sobre as medidas que podem ser tomadas no quotidiano para limitar o desperdício de alimentos. Os alunos preencheram um questionário online sobre as questões discutidas e forma convidados a deixar um comentário num painel, afixado na biblioteca. Algumas das ideias e comentários escritos serão partilhados a seu tempo.

terça-feira, 22 de outubro de 2024

"Miúdos a votos" - Participa!


"Miúdos a votos"  é uma iniciativa da Visão Júnior  e da Rede de Bibliotecas Escolares que procura juntar "cidadania e leitura, dando voz aos estudantes e aumentando a sua participação na vida da escola." (Visão Júnior).

Para apoiar as diferentes fases as entidades promotoras deste iniciativa irão disponibilizar três webinars, abertos a quem quiser participar e que terão as seguintes temáticas:

  • Como encontrar o livro (31 de outubro);
  • Como criar um podcast (10 de janeiro);
  • O teu voto conta! (7 de março).

Para mais informações podes falar com o teu professor titular de turma (1.º Ciclo), professor de Português (2.º e 3.º Ciclos) ou o professor bibliotecário.
Esclarece as tuas dúvidas! Participa!

terça-feira, 15 de outubro de 2024

Livros do mês - outubro - II


 "O que pode acontecer quando um livro se encontra inesperadamente no seu quotidiano com alguém e se essa pessoa for a Rainha, o que poderá ocorrer? Num passeio com os seus cães, a Rainha descobre uma carrinha de livros de uma biblioteca itinerante. Pode esse encontro mudar algo do seu quotidiano? 

"A Rainha nunca se interessara muito pela leitura. Lia, é claro, como toda a gente, mas gostar de livros era algo que deixava aos outros. Era um passatempo e fazia parte da natureza do seu cargo não ter passatempos. A sua função era mostrar interesse por, não deixar que ela própria se interessasse. Além disso, ler não era fazer. Ela era alguém que faz. (...)

Passados algumas semanas a Rainha sentiu-se perturbada e a pensar porque é que, neste momento particular da sua vida, sentira subitamente atração pelos livros. Donde surgira esse interesse?

Sim, poucas pessoas tinham visto mais mundo do que ela. Estando ela própria na tribuna do mundo, porque se entusiasmava agora com livros que, por muito que pudessem ser, não passavam de um reflexo ou versão do mundo? Livros? Ela vira a realidade. (...)

O apelo da leitura, pensou, vinha da sua indiferença: havia na literatura algo de nobre. Os livros não se importavam com quem os lia, nem se os líamos ou não. Todos os leitores eram iguais, incluindo ela própria. Porém, dúvidas e interrogações eram só o princípio. Uma vez no ritmo normal, deixou de lhe parecer estranho o facto de querer ler, e os livros, aos quais se afeiçoara tão cautelosamente, passaram pouco a pouco a ser o seu elemento. (...)

No seu encontro com Sir Kevin, ele adiantou:

- Se conseguíssemos aproveitar a vossa leitura para um objetivo maior: por exemplo, a melhoria dos critérios de leitura entre os jovens...

- Lemos por prazer - disse a Rainha.

A leitura fez-lhe pensar na escrita, nos que escreviam. E descobriu que depois de escrever alguma coisa, mesmo que fosse só uma nota no caderno, ficava feliz como dantes, depois de ter estado a ler. E ocorreu-lhe que ler era ser um espetador. Escrever era agir, o que ela devia fazer."

Bennett, A. (2009). A Leitora Real. Lisboa: Asa.

Na memória de Agustina


"Todos os meus livros são, afinal, só isso, a oportunidade de milhões de almas, únicas, todas elas, almas de sapinhos cheios de importância de viver. [...] Uns partem um pouco depois de dizerem bom dia, outros ficam até morrer. Todos se continuam naquilo que têm de profundamente entre si - a vocação para serem sós, porém aceites por cada uns dos outros. Porque a solidão que me acusam de impor aos meus personagens, como uma grilheta, é apenas a sua individualidade biológica, a exclusividade, a reivindicação superior da sua própria luta. Um homem jamais corresponde a outro homem; as suas reações e conclusões não equivalem a vivência de outra alma, a experiência do outro eu. O mistério do eu cumpre-se em cada homem de forma única." (1)

Há muitas coisas belas na terra, mas nada iguala a recordação de um dia de Verão que declina, e temos 11 anos e sabemos que o dia seguinte é fundamental para que os nossos desejos se cumpram. Quem conservar este sentimento pela vida fora está predestinado a um triunfo, talvez um tanto sedentário, mas que tem o seu reino no coração das pessoas.” (2)

"O mais veemente dos vencedores e o mendigo que se apoia num raio de sol para viver um dia mais, equivalem-se, não como valores de aptidões ou de razão, não talvez como sentido metafísico ou direito abstracto, mas pelo que em si é a atormentada continuidade do homem, o que, sem impulso, fica sob o coração, quase esperança sem nome." (3) 

“Não são os crentes que se salvam; são os que esperam em plano de igualdade com o que é eterno - a vida humana e a realidade dos seus direitos. Devo acrescentar aqui alguma coisa que sempre me pesou: acima dos amigos eu tive o pensamento; além da gratidão, eu pus o amor forte e generoso pela vida." (4)

Agustina Bessa-Luís:

(1) in Revista Lusíada. Porto, Outubro, 1955; (2) As Pessoas Felizes; (3) Sibila; (4) O chapéu de fitas a voar.

Filosofia para crianças - o que podemos pensar?


A palavra ainda parece criar dificuldades e, no entanto, ela refere-se a algo que já foi inventado há muitos séculos na antiga civilização grega. Vivemos num mundo habitado por pessoas, por coisas, ideias, sentimentos e quando cá chegamos, nós e todos os que são mais jovens defrontam-se com uma questão essencial. Como tudo começou e se tem uma duração limitada tem em si um valor muito valioso. Assim, como olhar para o que nos rodeia e pensar sobre aquilo que nos importa, que queremos conhecer.

Oficina de Filosofia é apenas uma forma não de encontrar respostas, mas de fazer perguntas, de modo a estimular a capacidade de pensar e de fazer refletir sobre coisas simples, mas que afetam a vida de todos. O que é uma pergunta, que características tem e as palavras o que nos podem dizer, o que podemos fazer com elas. Por que gostamos de histórias e porque elas ensinam a imaginar a tantas coisas?

Que coisas conseguimos explicar? O que lemos e o que sentimos pode ser expresso em palavras, ou os desenhos também nos podem explicar? E se não percebemos algo, como o explicamos a outros? Em que momentos usamos a imaginação? O preço e o valor das coisas são a mesma coisa ou existem diferenças? E conseguimos encontrá-las em momentos da nossa vida.

É um pouco isto e o ponto de partida foi um livro de Valter Hugo Mãe, As mais belas coisas do mundo. Descobri-las e pensar nelas como algo onde cada uma toca no seu quotidiano e pensar com os mais pequenos em perguntas como, pode-se amar ou gostar do que não se conhece? como conhecer as coisas que o mundo e os outros nos mostram? ou pode um abraço ser um espaço para se habitar, se viver, como uma casa?

Sobretudo fazer perguntas e pensar a partir de situações diversas para incentivar o antigo desejo da Filosofia grega, de analisar o que fazemos, pensamos e sentimos e como avaliamos o que fazemos. O vocabulário e a linguagem é um dos meios para formular essas perguntas e alargar o que conhece. A Filosofia vive do deslumbramento pelas coisas, as crianças da curiosidade e os seus porquês são um bom caminho para pensar, em círculo, como se cada um estivesse a procurar conhecer um mistério ou algo que não se conhece ainda.

As perguntas - a filosofia para crianças

 

As perguntas que valor têm? Saber fazer perguntas é uma forma de compreender de um outro modo? Ao fazer uma pergunta o que se procura saber ou compreender? As palavras são importantes, umas mais que outras? Que palavras usamos para pensar as perguntas que queremos fazer? Serão as perguntas instrumentos da curiosidade e da construção da imaginação?

A partir da obra de Valter Hugo Mãe, "As mais belas coisas do mundo" pensámos em perguntas e em formas de encontrar ideias sobre o que nos rodeia. Mais tarde publicaremos algumas das ideias ilustradas. 

Algumas das perguntas feitas pelas crianças (ABL4)  e que pensámos em conjunto:

Porque existem coisas belas no mundo?

Quais são as coisas mais belas do mundo?

Como podem as pedras ter sede se elas não têm vida?

Porque pode o pensamento ser tão importante?

Porque é que a imaginação existe?

sexta-feira, 11 de outubro de 2024

O escritor do mês de Outubro - Valter Hugo Mãe I (os livros)

 “Percebi que para dentro de nós há um longo caminho e muita distância. Não somos nada feitos do mais imediato que se vê à superfície. Somos feitos daquilo que chega à alma e a alma tem um tamanho diferente do corpo. Percebi que ver verdadeiramente uma pessoa obriga a um esforço como o de estarmos sentados nos nossos bancos a tomar conta do que passa pelos montes.”

 Mãe, V. H. (2017). “O Rosto”, in Contos de cães e maus lobos. Porto: Porto Editora.

 

Prémio Nobel da Literatura 2024

Será que é por existir dentro de nós uma qualquer brancura imaculada e inviolada que, quando nos deparamos com objetos tão límpidos, ficamos sempre comovidos? O percurso dela pelas ruas geladas condu-la ao prédio, onde o seu olhar se ergue para o primeiro andar. Para a frágil cortina de renda lá pendurada. 
Há alturas em que o branco áspero da roupa de cama acabada de levar quase parece falar. É quando o tecido de algodão puro roça na sua pele desnudada, nesse preciso momento, que parece estar a dizer-lhe qualquer coisa. És uma pessoa notável. O teu sono é puro, e não tens de ter vergonha de estar viva. É esse o estranho conforto que ela sente, nesse intervalo em que o sono aflora junto à vigília e o lençol áspero de algodão lhe toca na pele. “
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“Porque será que os minerais que brilham, como a prata, o ouro ou os diamantes, levam as pessoas a considerá-los nobres? Há uma teoria que justifica este facto e que defende que, para os primeiros homens, o brilho da água era um sinal de vida. Água que brilhasse era pura. Só a água que se pode beber – que dá vida – é transparente. Depois de caminharem por desertos, florestas e pântanos fétidos, sempre que um grupo conseguia avistar ao longe uma corrente de água com um brilho esbranquiçado, devia sentir-se dilacerado por tanta felicidade. Que significaria vida. Que significaria beleza.”
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“Com os teus olhos, verei o ponto mais profundo e mais assombroso de uma couve branca, as jovens e preciosas pétalas escondidas no seu coração.
Com os teus olhos, verei o frio da meia-lua que se ergue durante o dia.
A certa altura, esses olhos verão um glaciar. Olharão para aquela enorme massa de gelo e verão algo de sagrado, ainda não conspurcado pela vida.
Verão o silêncio da floresta de bétulas brancas. Verão a quietude da janela por onde entra o sol de inverno. Verão aquelas partículas brilhantes de pó agitando-se nos feixes de luz que se prolongam obliquamente até ao teto.
Dentro desse branco, de todas essas coisas brancas, sorverei o último sopro de ar que exalaste.”
Kang, Han. (2019). , "Cortina de renda"; "Cintilância"; "Toda a brancura", in O livro Branco. Lisboa: D. Quixote.
Prémio Nobel da Literatura 2024.

quinta-feira, 10 de outubro de 2024

O escritor do mês


A escrita tem em si um mistério que nos faz admirar esse esforça de cativar a página em branco para algo. Por que escrevem pessoas as palavras para nós que ao lê-las nos tornamos os leitores, confidentes desses espaços de escrita que são memórias e imaginação de vidas que estão ao nosso lado, mesmo que muitas vezes em tempos diversos. A escrita é sobre livros, redutos de palavras e emoções de alguém que se afastou momentaneamente do mundo para depois o convocar para as suas expressões e ideias. 

Na verdade temos uma grande dívida para quem escreve. Pois nas suas palavras cabem dimensões que torna o mundo melhor, mais compreensível nos seus aspetos de incerteza e dúvida. Nas palavras moram o reconhecimento de muitos mundos dando ao leitor a possibilidade de este se descobrir em possibilidades que são suas.

 Nas palavras dos escritores mora a nossa atenção, onde se juntam atenção, ideias e sonhos. Nas palavras da escrita podemos ser gigantes e sempre com uma nova possibilidade ali ao lado, num outro livro. No fundo as palavras escritas formam essa conjugação única de autores e escritores a descobrirem-se, a revelarem-se em si próprios.

O escritor do mês é uma ideia para divulgar palavras de escritores que nos podem espantar, fazer pensar ou iluminar aquilo que podemos ser. Uma luz pequena na noite escura não ilumina nada, mas diz-nos que existe escuridão. A literatura e a escrita são essa luz a mostrar a escuridão que envolve o real e os passos para fazer um caminho.

Dia mundial da alimentação I




 

terça-feira, 8 de outubro de 2024

Livros do mês - outubro - I

"O meu avô sempre dizia que o melhor da vida haveria de ser ainda um mistério e que o importante era seguir procurando. Estar vivo é procurar, explicava. Quase usava lupas e binóculos, mapas e ferramentas de escavação, igual a um detective cheio de trabalho e talentos. Tinha o ar de um caçador de tesouros e, de todo o modo, os seus olhos reluziam de uma riqueza profunda. Percebíamos isso no seu abraço. Eu dizia: dentro do abraço do avô. Porque ele se tornava uma casa inteira e acolhia-nos. Abraçar assim, talvez porque sou magro e ainda pequeno, é para mim um mistério tremendo.

 

Eu sei que ele queria chamar a atenção para a importância de aprender. Explicava sempre que aprender é mudar de conduta, fazer melhor. Quem sabe melhor e continua a cometer o mesmo erro não aprendeu nada, apenas acedeu[1] à informação. Ele achava que dispomos de informação suficiente para termos uma conduta mais cuidada. Elogiava insistentemente o cuidado. Era um detective de interiores, queria dizer, inspeccionava sobretudo sentimentos. Quando lhe perguntei porquê, ele respondeu que só assim se falava verdadeiramente acerca da felicidade. Para estudar o coração das pessoas é preciso um cuidado cirúrgico. Estava constantemente a pedir­me que prestasse atenção. Se prestares atenção vês corações e podes tirar medidas à felicidade. Como se houvesse uma fita métrica para isso.

 

Propunha que desvendasse adivinhas e dilemas. Propunha que desvendasse labirínticas lógicas. Prometia-me um novo livro ou um caderno com marcadores amarelos e vermelhos, os meus favoritos. Prometia que, se eu descobrisse cada resposta, me daria outro abraço ainda mais apertado e sempre mais amigo. Por melhores que fossem os cadernos, o orgulho que sentia naqueles abraços era a vitória. Comecei por entender que nenhuma vitória me gratificava mais do que descortinar uma resposta e aceder a um abraço. De cada vez que a nossa cabeça resolve um problema aumentamos de tamanho. Podemos chegar a ser gigantes, cheios de lonjuras por dentro, dimensões distintas, países inteiros de ideias e coisas imaginárias."


Mãe, Valter Hugo. (2010). As mais belas coisas do mundo. Porto: Porto Editora.

sexta-feira, 4 de outubro de 2024

Livros do mês...

 


Iniciamos esta semana o destaque dos livros que quinzenalmente destacaremos de formas diversas. A leitura, a sua promoção e a transformação que realizamos nas páginas das palavras são uma das mais importantes funções que uma biblioteca deve promover. Semanalmente destacaremos um livro que pela sua importância, pelos caminhos que abre aos leitores nos permitem fazer deles companheiros de uma viagem que é a do nosso quotidiano.

Os livros escolhidos obedecem à ideia de divulgação de algo que nos pode fazer enriquecer o que somos, o que vivemos. Livros que connosco realizem essa viagem e que nos permita chegar ao plano elevado que que António Lobo Antunes exprimiu de forma sábia, "ilhas eternas de fraternidade". Embora tendo nós na ideia, um conjunto de opções a destacar estamos disponíveis para alterar o que for relevante para o próprio currículo escolar.

 Os livros em destaque serão alvo de uma pequena apresentação no blogue. Estarão em suporte físico num espaço da biblioteca, e integrarão alguns dos espaços da difusão da informação da Biblioteca. Justamente a Newsletter que apresentaremos para os professores integrará alguns destes destaques. 

A Biblioteca organizará visualmente (em construção) desses destaques, assim como outro tipo de temáticas.

Biblioteca imaginária - leituras partilhadas




“Todos os livros são infinitos. Começam no texto e estendem-se pela imaginação. Por isso é que os textos são mais do que gigantescos, são absurdos de um tamanho que nem dá para calcular. Mesmo os contos, de pequenos não têm nada. Se soubermos entender, crescemos também, até nos tornarmos monumentais pessoas. Edifícios humanos de profundo esplendor.” (Valter Hugo Mãe, Contos de cães e maus lobos)

Lemos as palavras, lemos o mundo, as emoções dos outros, lemos os lugares onde vivemos, lemos o que nos rodeia. Nos livros encontramos outros mundos, outras formas de ser, de pensar, reconhecemos os outros e tentamos conhecer melhor o mundo onde estamos. Na leitura e com os livros desenvolvemos a imaginação, criamos mundos próprios, podemos inventar o que ainda não existe. As palavras fazem a biografia do mundo, dos que cá estiveram antes de nós e os que ainda virão. Com elas lemos a identidade dos espaços onde vivemos e conhecemos a experiência de cada pessoa, os seus sonhos e os seus desejos. Todos somos uma biblioteca imaginária. Lemos as palavras, lemos com os olhos, com as cores, com o rosto. Lemos entre o sonho e a perda, o doce e o amargo. Lemos no desafio às vezes difícil do que procuramos compreender.

No âmbito das atividades da biblioteca e do Projeto Escola a Ler desafiamos alunos, professores e outros elementos da comunidade educativa a partilharem as suas experiências de leitura. No blogue existirá uma etiqueta e uma página que reunirá todas as propostas, no sentido de que cada uma ou algumas possam motivar outros para a leitura e para a curiosidade de encontrar outros livros e diferentes autores.

A partilha poderá ser feita enviando o texto com a identificação do livro e o autor do texto (no caso dos alunos: alunos / turma) para o e-mail da biblioteca (biblioteca-aedcpf@agrupajunqueira.pt) ou diretamente numa página aberta (acesso aqui). Também é possível no envio do e-mail partilhar um ficheiro áudio com essa apresentação/comentário a uma experiência de leitura.

Ao lado o marcador que irá ser partilhado e o QR Code de acesso e com a apresentação mais completa desta ideia, de partilhar ideias formalizando o que numa comunidade pode formar uma biblioteca imaginária.

 

terça-feira, 1 de outubro de 2024

Receção aos quintos anos


As turmas de quinto ano foram recebidas durante a segunda semana de aulas na biblioteca e realizaram um conjunto de atividades em torno da utilização da biblioteca e das diferentes áreas que a mesma tem para oferecer. Foi lido um conto de Valter Hugo Mãe "modo de amar" e foi possível conversar com os alunos sobre o papel dos livros e das bibliotecas. A imaginação e o modo como a podemos alimentar foi uma dos pontos conversados com os alunos das diferentes turmas.

Cada aluno apresentou uma leitura realizada no passado e conversámos sobre o que ela tinha de marcante, o seu papel na memória de quem a leu. Foram apresentadas as palavras e o seu valor e cada aluno escolheu uma palavra mágica e pensámos sobre o valor que essas palavras desempenham em cada um. Foi interessante verificar que foram destacadas palavras tão importantes como:

- família; - amor; - mãe; - imaginação, - criatividades; - amigos;

Falámos sobre o valor da pergunta e o que ela nos permite construir. Finalmente cada aluno completou num placard duas frases, uma biblioteca é ...., ler é... (deixamos alguns registos dessas expressões)