quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Na memória de Rómulo de Carvalho

Existem palavras plantadas há muito, memória de um caminho que foi feito de plena curiosidade. Muitos gestos feitos com a imaginação a sondar os possíveis chegam a nós, aprendizes desta experiência feita mundo. Descobri-los e aprender com eles é compreender o que ficou tantas vezes perdido nas balizas do utilitário. Rómulo de Carvalho foi um ser excecional. Ele e o seu amigo António Gedeão criaram textos, experiências, manifestos culturais e científicos de infinitas multiplicidades. Com eles encontramos a divulgação científica, o artigo, o livro, o poema, o sonho de vencer o preconceito e a ignorância pela luta diária do pensamento. Que pessoas moravam em Rómulo e António Gedeão? 

Falamos modestamente e limitadamente dele, relendo um pouco das suas Memórias onde vive a sua experiência humana de um pouco mais de oito décadas, a sua perturbante honestidade de nos falar das grandezas e das misérias humanas. Lemos alguns poemas e com os professores de Físico - Química / Português foi possível alguns poderem experimentar experiências diversas que Rómulo criou nos seus livros de divulgação científica (centro de massa, periscópio, objetos magnetizados) e falar um pouco sobre as ideias que elas, as experiências e o poemas continham.

E ouvimos pelos alunos do 5.º B o poema "Lágrima de preta" que lendo "a inteligência das coisas" mostrava no seu tempo e neste como as separações por cor e outras são a negação da vida humana em si. Rómulo de Carvalho, um homem de um outro Renascimento fez da curiosidade uma experiência de sabedoria, até quando duvidava de si próprio e das suas capacidades. Foi disponibilizado um folheto sobre Rómulo e António Gedeão nesse jeito dele, "para si meu amigo..."

E fixámo-nos nestas palavras das suas Memórias, uma linha de vida...

" preciso de amor constante, o amor que se exprime em cada gesto e em cada olhar do quotidiano, mesmo sem contatos, sem palavras, sem premeditações, espontâneo, natural. Amor é um termo ambíguo que se presta a ridicularizar quem o pronuncia. Mas este de que falo não é o que nos faz supor de olhos brancos, em alvo. O amor de que falo é o que se opõe ao ódio, à violência, à dissimulação, ao orgulho, à prepotência, a todas essas "virtudes" que adornam os humanos com os loiros dos triunfos."

"Sejamos modestos. Compreendamos que tudo quanto podemos pensar está limitado pelas nossas condições físicas, pelo meio cultural, por todos aqueles que nos antecederam. Sejamos modestos. Eu nem sei sequer como são as coisas que vejo. Só sei como as vejo. Sejamos modestos nas nossas “certezas” e na defesa das nossas “razões”. É comum ver os seres humanos encolerizarem-se para impor as suas razões. Eu, pessoalmente, pouca importância atribuo às razões de cada um porque a razão é uma coisa que todos têm.  Há alguém que não tenha  razão? Não conheço”. (Memórias, p. 393)


Atividades de leitura - A maior flor do mundo (I)


Pensar as nossas escolhas, o que decidimos fazer e ou escolher são apenas algumas das possibilidades que o pensar nos permite concretizar. Como pensamos? Com palavras, com as emoções, com aquilo que nos envolve? No pensamento e no pensar sobre o que pensamos desempenha um papel essencial a pergunta. 

O que é uma pergunta é algo simples de explicar? O que procura uma pergunta apresentar? Uma dúvida, uma inquietação? Uma admiração, uma surpresa podem fazer nascer uma pergunta? E temos sempre de fazer perguntas? Todos conseguimos fazer perguntas e haverá perguntas que incomodam, perguntas que fazem rir? Pode cada um partilhar a sua pergunta a outro, ou isso é algo muito pessoal?

Foi a partir deste ponto de partida que se pensou sobre o que significa fazer perguntas e nesse sentido chegámos às palavras, à comunicação e aos instrumentos  da curiosidade para incentivar o uso da imaginação. Um sonho é uma construção imaginada de algo?

Surgiram palavras que são formas de olhar para a filosofia com / para crianças e que são verbos comunicativos a que chegámos e com os quais pensámos como são importantes para a comunicar:

  • Observar; 
  • Pensar;
  • Dialogar;
  • Concordar / Não concordar;
  • Escutar.
Da leitura do conto A maior flor do mundo, de José Saramago, as crianças de uma turma do 4.º ano (EB de Touguinha) escolheram conjuntos de palavras sobre as que lhes pareceram serem mais significativas para a narrativa. Com recurso ao texto escolheram as que se indicam em baixo e sobre as quais conversamos sobre o seu valor comunicativo na oralidade e na escrita. Foi a primeira fase desta atividade.



terça-feira, 26 de novembro de 2024

Dia nacional da cultura científica - Rómulo de Carvalho

 

 
Acesso no link em baixo ou por QR Code:

Leituras na Biblioteca - O ponto

 


A Vera não sabia desenhar. Perante a folha branca sentia-se a desanimar. A professora sugeriu-lhe que fizesse um rabisco. Ela desenhou um ponto e acrescentou-lhe o seu nome. A professora gostou do resultado e a Vera entusiasmada fez muitos pontos, de diferentes cores. A partir da leitura de O Ponto, de Peter Reynolds, duas turmas de crianças do jardim de infância (ABL) desenharam também alguns pontos. Muitas cores para uma expressão. A arte deve começar o mais cedo possível, um pouco como 0s livros...


 




domingo, 24 de novembro de 2024

Dia nacional da cultura científica - Pedra Filosofal

"Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.

Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento. 

Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é Cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham, 
que o sonho comanda a vida.
Que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança."

Dia nacional da cultura científica - Lágrima de preta

 

"Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.

Recolhi a lágrima 
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.

Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente. 

Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.

Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:
nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.

Água (quase tudo)
e cloreto de sódio."

Dia nacional da cultura científica - Poema para Galileo

 Poema para Galileo 


"(...) Eu queria agradecer-te, Galileo,
a inteligência das coisas que me deste.
Eu,
e quantos milhões de homens como eu
a quem tu esclareceste, (...)"

quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Leituras na Biblioteca - imaginar um jardim

 Construir um jardim imaginário. Pensar nesse espaço como lugar de encontro, foi o que as crianças do 1.º ano fizeram. O que pode ter um jardim? Que cores elementos cada um vê nele? É um lugar importante? De que modo? Desenhar esses espaços e conversar sobre esses elementos que nos rodeiam. Como um desenho ilustra uma ideia e que palavras escolher para o apresentar? 1.º ano da ABL.



  

 

Leituras na Biblioteca - O jardim secreto

A linguagem nas suas diversas formas permite pensar o que nos rodeia e com ela, sejam linhas, cores, ou palavras  exprimir uma ideia, uma opinião. É um dos caminhos para a leitura orientada para os mais jovens. Foi essa proposta feita com uma turma do 1.º ano.

O Jardim curioso, de Peter Brown é a história verdadeira de um jardim recuperado em Manhattan. A visita a uma  velha linha de caminho de ferro e a u conjunto de fábricas abandonadas permitiu ao Jorge ver o que o rodeava e talvez mudar alguma coisa. Flores ainda rebentavam entre o lixo industrial. Poderia ele mudar alguma coisa no local? Podemos nós no natural fazer algo e com isso aprender algo? E se sim, o que nos podem dar os jardins para o quotidiano de cada um? Uma pergunta para pensar em formas e em cores

A linguagem nas suas diversas formas permite pensar o que nos rodeia e com ela, sejam linhas, cores, ou palavras exprimir uma ideia, uma opinião. É um dos caminhos para a leitura orientada para os mais jovens. Foi essa proposta feita com mais uma turma do 1.º ano. 

quinta-feira, 14 de novembro de 2024

Um poema...


"Em todos os jardins hei-de florir,

Em todos beberei a lua cheia.
Quando enfim no meu fim eu possuir
Todas as praias onde o mar ondeia.

Um dia serei eu o mar e a sereia,
A tudo quanto existe me hei-de unir,
E o meu sangue arrasta em cada veia
Esse abraço que um dia se há-de abrir.

Então receberei no meu desejo
Todo o fogo que habita na floresta
Conhecido por mim como um beijo.

Então serei o ritmo das paisagens,
A secreta abundância dessa festa
Que eu via prometida nas imagens."

Sophia, “Em todos os jardins”, in Obra Poética. Lisboa: Assírio & Alvim, 2015.
Imagem: Copyright – m.ban.

sexta-feira, 8 de novembro de 2024

O livro e a leitura I

Celebrar os momentos íntimos da leitura!

“Dos diversos instrumentos do homem, o mais assombroso é, indubitavelmente, o livro. Os outros são extensões do seu corpo. O microscópio e o telescópio são extensões da vista; o telefone é o prolongamento da voz; seguem-se o arado e a espada, extensões do seu braço. Mas o livro é outra coisa: o livro é uma extensão da memória.”

Borges, Jorge Luís. Ensaio. São Paulo: Companhia das Letras. 
Imagem: Copyright - Teodor Axentowicz, "Absorvida na leitura", Polónia (2ª metade do século XIX e primeiros anos do século XX).

A Criatividade e o seu papel na aprendizagem

Ken Robinson foi uma figura inspiradora para a mudança significativa que a educação necessita, enquanto sistema formativo em si, mas também como elemento de possível felicidade para as pessoas e de transformação com significado com a sociedade. As suas apresentações em diversas plataformas evidenciaram um conjunto de mudanças que precisamos pensar. Algumas das suas palavras e um dos vídeos sobre uma das suas estimulantes ideias.

"Estamos a educar crianças e jovens desprovidas de criatividade. Que ferramentas usarão no futuro? É essencial repensar os princípios sobre os quais assentam os sistemas educativos!

Sou de opinião que a criatividade é hoje tão importante na educação quanto a alfabetização e que deveríamos tratá-la com a mesma importância. As crianças assumem riscos e perante o que lhes é colocado respondem. Elas não têm medo de errar. O que sabemos é que, quem não está preparado para errar, nunca poderá ter uma ideia original. E quando se tornam adultas, a maioria já perdeu essa capacidade. E adquirem o medo, pavor de errar.

A sociedade, as empresas estigmatizam os erros. No momento vivemos em sistemas educativos nacionais em que os erros são a pior coisa que se pode fazer. E o resultado é que estamos produzindo indivíduos desprovidos de criatividade. E acredito que se não crescemos com ou rumo à criatividade, vamos para longe dela. Ou melhor somos ensinados a abandoná-la. (...)

Temos de repensar os princípios fundamentais nos quais baseamos a educação. Há que celebrar o dom da imaginação humana. Temos de ter cuidado para usar esse dom com sabedoria, e assim ultrapassar o estado em que estamos. E a única forma de fazermos isso é encarar as nossas capacidades criativas como a riqueza que representam e, encarar as nossas crianças e jovens como a esperança que representam. E a nossa tarefa é educá-las em todo o seu ser, para que elas possam enfrentar esse futuro. E o nosso trabalho é ajudá-las a tirar algo de bom dele." (Ken Robinson)

Uma das suas apresentações no TED (Ideas change everything) -  Bring on the learning revolution)

quarta-feira, 6 de novembro de 2024

Na memória de Sophia

Na memória de Sophia de Mello Breyner Andresen:

(Porto, 06.11.1919)

Nos tempos de utilidade em que vivemos a dimensão poética tornou-se algo quase despercebido, pouco considerado. E, no entanto, estamos muito carentes de encontrar na beleza o suporte para representar pela arte no seu sentido geral, a nossa dimensão poética. Sophia que nasceu num seis de novembro falou-nos muito disso, dos valores espirituais, como suporte a uma cultura de alma.

Ver com essa graça é um dos testemunhos da sua obra poética e para crianças. E nesse sentido todos, ou talvez alguns poderíamos procurar olhar aquilo que ela chamou "o tempo inteiro", a visão poética do mundo e uma forma de o viver. A poesia como uma forma específica e substantiva concreta de existir, foi um dos seus caminhos na vida, como se a forma de olhar o mundo pudesse ser uma forma de existência desse tempo inteiro.

Um baloiço rente ao chão e ao mar, como um espaço de tempo, onde a liberdade se povoa de um pensamento feito do que existe. Com Sophia há tudo ainda para aprender, nesse programa de uma palavra para nomear o mundo, ou como ela o disse, "a beleza que o homem tem o dever de criar". Podia ser um sinal para outas possibilidades, outro tempo para essas cidades acima do caos e das suas sombras.

"Há uma beleza que nos é dada: beleza do mar, da luz, dos montes, dos animais, dos movimentos e das pessoas. Mas há também uma outra beleza que o homem tem o dever de criar: ao lado do negro da terra é o homem que constrói o muro branco onde a luz e o céu se desenham. A beleza não é um luxo para estetas, não é um ornamento da vida, um enfeite inútil, um capricho. A beleza é uma necessidade, um princípio de educação e de alegria. Diz S. Tomás de Aquino que a beleza é o esplendor da verdade. Pela qualidade e grau de beleza da obra que construímos se saberá se sim ou não vivemos com verdade e dignidade. A obra do homem é sempre um espelho onde a consciência se reconhece."

Sophia de Mello Breyner Andresen, in 'Entrevista Jornal Távola Redonda, Janeiro de 1963.

Imagem, Sophia de Melo Breyner Andresen - desenho de Arpad Szènes.

A grande fábrica de palavras - II

As palavras apresentam-se como recursos de comunicação para nos ligarmos ao mundo, expressarmos os nomes das coisas e escrevermos o nosso sentido, a nossa visão do mundo. Serão elas a nossa única forma de nos expressarmos? A emoção e o que pensamos pode ser expresso de um outro modo? E serão esses outros modos possíveis de nos fazer entender no que queremos expressar? E as palavras, quais são as que mais importam a cada um e a quem as oferecer?

Foi sobre isto que falámos com as crianças do 2.º ano. Elas pensaram em duas palavras, em alguém a quem as oferecer e apresentaram essa escolha. Deixamos em baixo algumas dessas palavras.


 
 

 

Atividade realizada a partir da leitura da obra, A grande fábrica de palavras  de Agnés de Lestrade.

terça-feira, 5 de novembro de 2024

Leituras na Biblioteca - a grande fábrica de palavras - I

 

"Existe um país onde as pessoas quase não falam. É o país da grande fábrica de palavras. Neste estranho país é preciso comprar e engolir as palavras para pronunciá-las. A grande fábrica de palavras trabalha de dia e de noite. As palavras que saem das suas máquinas são tão variadas quanto as linguagens. Há palavras que são mais caras que outras e que raramente são ditas; a não ser que sejamos muito ricos! No país da grande fábrica, falar sai caro!"

As palavras e a linguagem são um património pessoal de cada um para reconhecer o mundo e identificar as coisas, os seus nomes e estabelecer uma relação com os outros. Nós somos as palavras que temos e o mundo de que somos feitos é desenhado pelo nosso vocabulário. Lemos e escrevemos usando esse recurso com o qual nos relacionamos com o mundo.

A grande fábrica de palavras foi uma das histórias lidas a crianças do 2.º ano para em conjunto percebermos de onde vem as palavras, que valor elas têm quando usadas, como as utilizamos para exprimir emoções. Existe um país em que as pessoas não falam, é o país da grande fábrica de palavras. E nesse país as palavras que se usam têm de ser compradas. Como as utilizam quem tem menos recursos para as comprar? Como comunicam com os outros? E, afinal quais são as palavras mais importantes, as que guardamos com especial cuidado?

Primeira descoberta a realizar. Sendo tão importantes, onde estão as palavras, como acedemos a elas? E o que nos dão elas? Exprimir o que sentimos, o que queremos dizer. As palavras moram em nós. Ler é assim uma das formas de imaginar novas possibilidades para tudo o que imaginamos.

Segunda descoberta. Que palavras podemos oferecer aos outros? Que palavras pensamos quando imaginamos algo para oferecer a alguém especial, alguém que nos toca? Que palavras imaginaram as crianças oferecer? E essas palavras foram escolhidas porque se relacionam com algo importante na vida de cada um... 

Terceira descoberta. As nossas palavras são assim pois formas de construção do nosso mundo e de nos construirmos nele. As nossas palavras apresentam-se como os nossos próprios limites, das nossas possibilidades nessa construção. Alargar o seu conhecimento e o seu uso é uma forma de dar mais amplitude ao que podemos ser.

 Lestrade, Agnés de. (2023). A grande fábrica de palavras. Lisboa: Paleta de Cores.