A data merecia que hoje compreendêssemos como estamos desatentos às formas de exploração dos seres humanos. E, nesse sentido a leitura e a escrita podem ser formas de compreender essa luta interior das mulheres por séculos de esquecimento. A luta pela liberdade, a existência que procura esse axioma hegeliano, o ser é “ter-se tornado, é ter feito tal qual se manifesta” vive desses universos particulares que foram os espaços íntimos da leitura.
A recuperação desses momentos é uma forma de compreender uma luta de grande convicção, de ondas, onde muitos, sobretudo mulheres pereceram e a que nós escapamos. O livro e a leitura são o domínio do feminino, a escrita foi a sua teia de vida. Os homens sempre foram raros leitores. As cartas eram a prova de vida de uma escrita e de uma sobrevivência, onde corriam o amor, o medo, a idade, a morte e do que se alimentavam vida e esperança.
A linguagem é uma estima no feminino pelas palavras, por uma candura de imaginação, onde repousasse o conhecimento capaz de preencher os dias e mudá-los. A Inquisição foi uma fogueira alimentada por mulheres e livros. Os homens pela circunstância do poder, da mineralização das pedras tornadas palácios são agentes de uma palavra sedentária que pouco confia na beleza da palavra. Não imaginamos um homem a embrulhar no mercado um peixe com um resto de poemas desalinhados.
Os homens são agentes de palavras formais, as do Estado, as da ordem, as das normas. Os livros foram a grande companhia do universo feminino. Nessa sabedoria de tentarem revelar a vida foram com as palavras as formas de como rostos femininos perceberem melhor os poros da vida. A luta das mulheres, da leitura e dos livros foram essa oposição ao formalismo do inexpressivo que o poder económico, político e religioso sempre procurou estabelecer. É sobre essa imaginação de belo que a arte dá conta e que exprime de um outro modo uma luta antiga por algo elevado e essencial, a própria vida.